Destaques

Parecer do Procurador-Geral António Cândido Ribeiro da Costa, relativo ao encerramento do Seminário de Bragança, por ordem do Arcebispo da mesma Diocese, em consequência do motim ocorrido na noite de 12 de dezembro de 1904.

14 de março de 1905

Associando-se à comemoração do centenário da sua morte, o Arquivo Histórico do Ministério Público divulga o parecer inédito de António Cândido, Procurador-Geral da Coroa e Fazenda entre 1898 e 1910, acerca do encerramento do Seminário de Bragança e da aplicação de graves penas disciplinares aos seus alunos, por ordem do Bispo da mesma Diocese, D. José Alves de Mariz, em consequência do motim ocorrido no Seminário em 12 de dezembro de 1904.

O motim em causa suscitou um debate animado, quer na sociedade civil, quer entre a classe política e os representantes da Igreja, de que dão testemunho tanto os Diários da Câmara dos Pares e da Câmara dos Deputados, como a imprensa regional.

Logo em 19 de fevereiro seguinte, a Gazeta de Bragança (1) noticiava: “A cidade de Bragança, representada por todas as classes sociaes, em um comício celebrado no Theatro Camões pede justiça contra uma verdadeira iniquidade commetida pelo Bispo da Diocese Brigantina”.

Tanto o parecer de António Cândido para o Ministério dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, expedido a 14 de março de 1905, como a Portaria da Direcção-Geral dos Negócios Eclesiásticos de 15 de abril seguinte, são claros na condenação das atitudes e decisões do Bispo D. José de Mariz; em causa estava, por um lado, o desrespeito à lei e ao Estado, ao não ter sido sequer dado conhecimento dos factos, nem ao próprio Governo, nem ao Governador Civil do distrito e, por outro, à arbitrariedade da decisão do encerramento do Seminário e de expulsão de alguns estudantes e da reprovação de outros, sem nenhum critério de justiça que a suportasse. Estas medidas eram especialmente contestadas pela sociedade civil, em virtude de os seminários representarem, para os mais desfavorecidos, a única forma de acesso ao ensino.

A Portaria referida foi alvo de protestos veementes por parte das autoridades eclesiásticas, nomeadamente por António Homem de Gouveia, deputado e cónego da Sé do Funchal, que considera vir aquela “vibrar golpe profundo nos direitos da Igreja Catholica”. O Ministro dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça, José de Alpoim, com idêntica veemência, defendeu a obrigação de os membros da Igreja respeitarem a lei do seu país.

A polémica prolongou-se até à República, tendo havido nova ocorrência no Seminário, com o rebentamento de uma bomba por baixo dos aposentos do Bispo (que estava ausente), na noite de 13 de dezembro de 1909 (2); nas duas Câmaras do Parlamento, em 1910, em debates sobre a administração dos seminários, ainda continuava a ser referido o motim de 1905.

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(1) Gazeta de Bragança, nº 2, de 19 de março de 1905, citada em “Bragança. Roteiros Republicanos”, João Manuel Neto Jacob e Vítor Simões Alves, ed. Comissão para as Comemorações do Centenário da República/QuidNovi, 2010, p. 23.

(2) Cf. Primeiro de Janeiro, 14 de janeiro de 1909, p. 3, citado em “Bragança. Roteiros Republicanos”, João Manuel Neto Jacob e Vítor Simões Alves, ed. Comissão para as Comemorações do Centenário da República/QuidNovi, 2010, p. 25.

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Pode aceder à transcrição do parecer AQUI.